Natureza química dos ácidos nucleicos

Isolando e purificando o conteúdo nuclear, foi possível identificar os seus constituintes. Estes podem ser agrupados em tipos fundamentais:

  • Ácido fosfórico – presente em ambos os tipos de ácidos nucleicos, é o responsável pelo carácter ácido destas biomoléculas;

  • Pentoses – os glícidos de 5 carbonos presentes podem ser de dois tipos:

    • Ribose – C5H10O5 está presente no ácido ribonucleico (RNA), sendo a origem da sua designação;

    • Desoxirribose – C5H10O4 está presente no ácido desoxirribonucleico (DNA), sendo, novamente, a responsável pela sua designação.

  • Bases azotadas – existem cinco tipos de bases azotadas diferentes, que podem ser divididas em dois grupos.

    • Bases azotadas púricas ou de anel duplo – adenina (A) e guanina (G);

    • Bases azotadas pirimídicas ou de anel simples – citosina (C), timina (T) – presente apenas no DNA - e uracilo (U) – presente apenas no RNA.

Os ácidos nucleicos são polímeros em que os monómeros se designam nucleótidos. Essa unidade básica vai, então, ser composta por um elemento de cada uma das categorias anteriores (um fosfato, uma pentose e uma base azotada). A designação do nucleótido deriva da base azotada que entra na sua composição: nucleótido adenina, nucleótido citosina, nucleótido guanina, nucleótido timina e nucleótido uracilo. Quando a um nucleótido se retira o grupo fosfato obtém-se um nucleósido (pentose mais base azotada).

Para formar cada nucleótido ocorrem reacções de condensação, estabelecendo-se ligações entre o grupo fosfato e o carbono 5’ da pentose e entre a base azotada e o carbono 1’ da pentose.

Estes nucleótidos podem unir-se sequencialmente, originando uma cadeia polinucleotídica. Os ácidos nucleicos podem estar organizados em cadeia simples ou dupla de nucleótidos, unidos através da pentose de um e o grupo fosfato de outro: quando uma cadeia está em formação, cada novo nucleótido liga-se seu grupo fosfato ao carbono 3’ da pentose do último nucleótido da cadeia. Assim, sempre que um nucleótido apresenta o seu carbono 3’ livre pode ligar-se a outro. Por este motivo, as cadeias polinucleotídicas de DNA ou RNA crescem sempre no sentido 5’ " 3’.                                                                                                                                                                                      TOPO

Estrutura do DNA

Assim, com base em numerosas experiências realizadas por diversos investigadores, em 1953 James Watson e Francis Crick, da Universidade de Cambridge, apresentaram uma proposta de estrutura para o DNA. Os dados em que se basearam foram:

  • Há uma constância no conteúdo de bases no DNA de cada espécie;

  • A composição média em bases do DNA difere de espécie para espécie;

  • A razão entre a adenina e a timina e entre a citosina e a guanina, nas várias células, é sempre aproximadamente igual a 1;

  • A soma das purinas é sempre igual à soma das pirimidinas (deduzido a partir do anterior);

  • Fotografias tridimensionais revelaram uma grande regularidade no arranjo atómico das moléculas de DNA;

  • Fotografias de raio X revelam uma estrutura helicoidal.

Estrutura comparativa do DNA e do RNA

Esta hipótese, posteriormente comprovada, valeu-lhes o prémio Nobel em 1962. Segundo este modelo, cada cadeia de DNA é formada  por duas cadeias polinucleotídicas enroladas helicoidalmente em volta do mesmo eixo, como uma escada de caracol.

Desta estrutura do DNA salienta-se:

  • Os lados da molécula (os corrimões da escada de caracol) são formados por grupos fosfato alternados com desoxirribose, enquanto os degraus da escada, ao centro, são pares de bases azotadas ligadas entre si por pontes hidrogénio;

  • As bases azotadas emparelhadas nos degraus são complementares, ou seja, a adenina liga-se à timina por duas pontes H (A=T) e citosina liga-se à guanina por três pontes H (C=G);

  • As duas cadeias polinucleotídicas desenvolvem-se em sentidos opostos – cadeias antiparalelas -, cada uma iniciando-se uma extremidade 5’ e terminando numa extremidade 3’;

  • Apesar de apenas existirem apenas 4 tipos diferentes de nucleótidos no DNA, dado que cada um deles pode estar presente em quantidades variáveis e elevadas, a sequência de bases de cada cadeia polinucleotídica terá biliões de possibilidades, permitindo que cada indivíduo tenha um DNA único.

O DNA está sempre localizado no núcleo da célula, com excepção do DNA original das mitocôndrias e dos cloroplastos. A quantidade de DNA de um indivíduo é igual em cada uma das suas células, onde se mantém constante (com excepção do período mitótico).

Pode-se agora compreender que, sendo o DNA o suporte da informação genética, os genes não são mais que segmentos de cadeias polinucleotídicas que codificam determinada característica. Cada gene pode ser composto por milhares de pares de nucleótidos. Nos quase dois metros de DNA presente no núcleo de cada célula humana, existem milhares de genes.

O genoma corresponde ao conjunto dos genes e da informação genética de um dado indivíduo.                                                                   TOPO

Estrutura do RNA

O ácido ribonucleico, ou RNA, forma moléculas muito menores que as do DNA. Na sua grande maioria, o RNA encontra-se no citoplasma, onde desempenha diversas funções relacionadas com a construção de proteínas, ou seja, faz chegar a informação contida no DNA ao exterior do núcleo.

O RNA é um ácido nucleico de cadeia simples, contendo a pentose ribose e as bases azotadas adenina, citosina, guanina e uracilo (veja imagem acima).

Conforma a função que desempenha, o RNA apresenta formas diferentes, podendo mesmo apresentar zonas dobradas sobre si mesmo, em que a cadeia se emparelha por ligações A=U e C=G.

Existem três tipos diferentes de RNA:

  • RNA ribossómico ou RNAr – representa cerca de 80% do RNA presente na célula. Tem, em média, cerca de 3700 nucleótidos. É uma molécula larga e dobrada que, associada a proteínas, forma o ribossoma, organitos citoplasmáticos que coordenam a síntese proteica;

  • RNA de transferência ou RNAt – representa cerca de 15% do RNA da célula e tem, em média, 75 nucleótidos. Embora formada por uma única cadeia de nucleótidos, dobra-se sobre si próprio de uma forma característica (em folha de trevo), originando zonas de cadeia dupla. Em todas as moléculas de RNAt algumas características são comuns:

    • Extremidade 5’ é fosforilada;

    • Extremidade 3’ tem a sequência CCA, com a adenina ligada a um grupo hidroxilo –OH), local de ligação do aminoácido activado pelo ATP, originando o complexo RNAt-aminoacil;

    • Nucleótidos que não estabelecem pontes de hidrogénio entre si originam quatro ansas (a zona alargada que forma as folhas do trevo): na ansa 1 liga-se a enzima que catalisa as reacções, a ansa 2 é o anticodão (sequência de 3 nucleótidos complementares de cada codão do RNAm), na ansa 3 liga-se o ribossoma e a ansa 4 é formada pelas extremidades 3’ e 5’, onde se liga o aminoácido;

  • RNA mensageiro ou RNAm – presente em baixa percentagem na célula (cerca de 5%), tem um tamanho muito variável. Esta molécula tem vida muito curta, apenas transmite a mensagem do DNA do núcleo para o citoplasma.

A quantidade de RNA presente numa célula depende em grande parte da taxa metabólica da célula (quanto maior esta for, mais RNA estará presente).                                                                                                                                                                                              TOPO

Replicação

A molécula de DNA é a fonte de informação da célula, logo deverá ser uma macromolécula com um alto grau de organização. Esta organização é traduzida pela sequência de nucleótidos, de acordo com uma ordem específica para cada indivíduo.

A célula tem a capacidade de reproduzir a informação contida no DNA, formando outra molécula igual à primeira, através do processo conhecido por replicação.

Antes de se começar a replicar, o DNA separa-se das histonas, a que se segue o desenrolamento da dupla hélice.

Durante a replicação, ou seja, durante a formação da réplica ou cópia, as duas cadeias polinucleotídicas começam por se separar, por acção de uma enzima que quebra as pontes hidrogénio entre as bases azotadas complementares. Este processo ocorre em vários locais da molécula-mãe – pontos de iniciação – prosseguindo em ambos os sentidos até que toda a molécula esteja replicada. Cada uma destas bolhas de replicação designa-se replicão. Cada uma das cadeias-mãe vai servir de molde – primer – para a síntese da cadeia complementar, por incorporação de novos nucleótidos, presentes na célula.

De seguida, forma-se a cadeia complementar a cada uma das cadeias-mãe, por adição enzimática – DNA-polimerases - de nucleótidos presentes na célula. Os novos nucleótidos são adicionados segundo a regra das bases complementares, garantindo, assim, que a nova cadeia seja igual há que já existia.

Como já se sabe, as cadeias polinucleotídicas são antiparalelas, ou seja, uma encontra-se orientada no sentido 5’ ® 3’ e a outra no sentido 3’ ® 5’. Como todas as DNA-polimerases sintetizam a cadeia polinucleotídica no sentido 5’ ® 3’, a cadeia nova com essa orientação crescerá por adição contínua de novos nucleótidos. No entanto, a cadeia com orientação 3’ ® 5’ terá que resultar da união de pequenos segmentos, sintetizados previamente no sentido 5’ ® 3’. A união é feita enzimaticamente pela DNA-ligase.

Assim, cada cadeia-filha é constituída por uma cadeia velha e por uma cadeia nova, antiparalelas. Por esse motivo, a replicação diz-se um processo semi-conservativo, que assegura a manutenção das características da espécie.

Este mecanismo de replicação é comum a todos os organismos, sejam eles eucariontes ou procariontes. No entanto, nos procariontes, a replicação inicia-se num único ponto da cadeia polinucleotídica e prossegue até terminar. Isto é possível pois nestes organismos apenas existe uma molécula de DNA e porque o seu comprimento é muito menor que o do DNA eucarionte.

Apesar de fácil de compreender, este mecanismo está longe de ser simples do ponto de vista bioquímico, envolvendo numerosas enzimas e mecanismos de segurança, embora bastante rápido.

Este modelo de replicação não foi o único proposto, tendo sido igualmente propostos outros dois mecanismos, que pareciam viáveis:

  • Replicação conservativa – segundo este modelo, a molécula-mãe mantinha-se íntegra (seria conservada), apenas servindo de molde à nova molécula. Esta seria formada por duas cadeias construídas a partir de nucleótidos presentes na célula;

  • Replicação dispersiva – neste modelo, a molécula-mãe seria distribuída, em porções, pelas duas moléculas-filhas, as quais seriam constituídas por uma mistura de nucleótidos novos e antigos.                                                                                                          TOPO

Código Genético

Se apenas usássemos uma base para representar um aminoácido apenas teríamos proteínas com 4 tipos de aminoácidos. Dado que tal não acontece, teremos que utilizar combinações de bases para representar aminoácidos.

Não podemos ter apenas pares de bases pois assim apenas seriam codificados 16 (42) aminoácidos, logo teremos que usar tripletos, ou seja, conjuntos de 3 bases, que nos permitem codificar 64 (43) possibilidades, muitas mais do que as que necessitamos. Esse conjunto de 3 bases que codificam um aminoácido designa-se vulgarmente codão.

Este código genético em algumas características importantes:

  • Universalidade – este tipo de codificação em tripletos é usada por toda a Vida na Terra, desde os organismos mais simples, como as bactérias ou os vírus, aos mais complexos. Esta universalidade garante que o código terá surgido muito cedo na evolução da Vida na Terra, provavelmente logo no primeiro ancestral procarionte dos organismos actuais;

  • Redundância – no código existem vários codões com o mesmo significado, identificando o mesmo aminoácido, consequência directa do facto de haver um número superior de tripletos do que de aminoácidos. Por este motivo, a terceira base de cada tripleto é a menos específica (o aminoácido arginina, por exemplo, pode ser codificado pelos codões CGU, CGC, CGA e CGG);

  • Objectividade – o código não é ambíguo, cada codão apenas codifica para um aminoácido, não gerando confusões;

  • Tripleto AUG tem dupla função – codifica o aminoácido metionina e é um codão de iniciação da síntese proteica (logo todas as proteínas começam com este aminoácido). Esta situação, no entanto, apenas se aplica aos organismos eucariontes e às arqueobactérias;

  • Tripletos UAA, AAG, UGA são codões de finalização – estes codões aparentemente sem sentido, indicam o momento de fim de síntese, não codificando aminoácidos.

Um tripleto, portanto, corresponde à menor unidade da informação genética, sendo a sequência de tripletos no DNA a responsável pela sequência de aminoácidos numa proteína. No entanto, o DNA contém a informação para a construção mas não a capacidade de construir ele próprio as proteínas. Esse processo ocorre nos ribossomas, organitos citoplasmáticos. 

Como chega ao citoplasma essa informação?                                                                                                                                          TOPO

Síntese Proteica

A passagem da linguagem dos ácidos nucleicos para a linguagem das proteínas ocorre em duas etapas:

  • Transcrição – cópia da sequência de bases do DNA para uma cadeia complementar de RNAm, que é passado ao citoplasma. Esta etapa decorre no núcleo, mais exactamente no nucléolo. Apenas uma cadeia de DNA é usada como molde para síntese de RNAm, segundo a regra do emparelhamento de bases. Esta síntese é comandada pela enzima RNA-polimerase, que desliza ao longo de um troço de DNA, abrindo a cadeia e iniciando a síntese, sempre no sentido 5’ à 3’. Após a passagem da RNA-polimerase a cadeia de DNA volta fechar, formando-se as pontes H entre as bases. Após a síntese deste RNA-pré-mensageiro inicial ocorrem alterações: sequências não codificantes – intrões – são cortadas e as sequências codificantes restantes – exões – são unidas entre si, formando o RNAm funcional, que migra para o citoplasma;

  • Tradução – produção da proteína, segundo a sequência de codões do RNAm, com a ajuda dos RNAt e RNAr. Esta etapa decorre no citoplasma, em eucariontes quase sempre nas membranas do retículo endoplasmático rugoso, onde os ribossomas estão inseridos. Neste caso, as proteínas sintetizadas são enviadas para o interior das cisternas do RER, sendo depois distribuídas por toda a célula. Em procariontes, que não apresentam sistemas membranares, os ribossomas estão dispersos no citoplasma. O processo tem 3 etapas, por sua vez:

    • Iniciação – o RNAm liga-se ao ribossoma na subunidade grande (através do RNAr). O RNAt iniciador transporta o aminoácido metionina até à subunidade menor do ribossoma;

    • Alongamento – sequencialmente, um novo RNAt transporta um novo aminoácido até ao ribossoma, ligando-se ao codão. Há formação de uma ligação peptídica entre o aminoácido que chega e os anteriores e o ribossoma avança 3 bases no RNAm. O estabelecimento destas ligações requer energia, fornecida, como sempre, por degradação de moléculas de ATP;

    • Finalização – os codões de finalização já referidos não têm anticodão complementar, pelo que quando o ribossoma atinge um deles, a síntese acaba, a cadeia polipeptídica destaca-se, podendo sofrer transformações posteriores no retículo e no Golgi. As subunidades do ribossoma separam-se e ficam livres para iniciar nova síntese.

A síntese proteica tem características fundamentais para a sua função:

  • Complexidade – são inúmeros os intervenientes neste processo, entre enzimas, vários tipos de ácidos nucleicos e moléculas fornecedoras de energia;

  • Rapidez – uma célula eucariótica pode construir uma proteína com 140 aminoácidos em 2 minutos, mantendo todo o rigor do processo;

  • Amplificação – a mesma zona do DNA pode ser transcrita várias vezes, formando-se várias moléculas de RNAm idênticas, o que compensa a sua curta duração. Outra forma de acelerar o processo é utilizar polirribossomas, ou seja, vários ribossomas vão “lendo” a mesma molécula de RNAm, em sequência, produzindo cada um a sua proteína.                                                                               TOPO

Estrutura dos cromossomas eucarióticos

Desde muito cedo na utilização do microscópio, que se observavam no núcleo estruturas que coravam de vermelho ou violeta com corantes básicos. Os investigadores apelidaram essas estruturas cromossomas, literalmente, corpos corados.

Observações subsequentes mostraram que cada espécie tem um número característico de cromossomas por núcleo: as células humanas têm 46, as dos perus tem 82 e alguns fetos chegam a ter 1000 cromossomas.

Os cromossomas de cada espécie têm uma morfologia característica, relativamente ao tamanho e forma. Assim, o conjunto de cromossomas de uma célula caracteriza uma espécie e passa a designar-se cariótipo.

Visto ao microscópio óptico, o cromossoma corado parece-se com um pequeno corpo sólido e flexível. No entanto, o cromossoma não é uma estrutura sólida, sendo antes composto por uma longa cadeia de DNA enrolado em espiral (35%), associado a proteínas – histonas – (60%) e RNA (5%).

O DNA eucariótico tem vários níveis de enrolamento:

  • Dupla hélice – enrolamento das duas cadeias polinucleotídicas em volta uma da outra;

  • Nucleossoma – cerca de 200 pares de bases da dupla hélice enrola-se em volta de um conjunto de 8 subunidades de histona;

  • Solenóide ou superhélice – conjuntos de nucleossomas dispõem-se helicoidalmente, formando um cilindro flexível com cerca de 30 hm de diâmetro. Cada solenóide é formado por 6 nucleossomas.

Cada cromossoma apresenta uma constrição mais ou menos central designada centrómero. Se um cromossoma tiver 1 cm de comprimento, a molécula de DNA que o compõem teria, quando esticada, o comprimento de um campo de futebol.

Este material genético pode apresentar-se sob duas formas:

  • Eucromatina – também designada cromatina dispersa, está presente quando a célula não se encontra em divisão, dispersa no núcleo sob a forma de filamentos finos e longos;

  • Heterocromatina – também designada cromatina condensada, forma-se quando a célula se prepara para se dividir, formando filamentos curtos e espessos, com grande afinidade para os corantes (cromossomas).                                                                                     TOPO

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